Sangue novo nas dunas do Meco

No Dia Mundial da Orientação também quisemos fazer parte da festa, promovendo três provas em menos de 12 horas. Foi deste modo que o ADN Sesimbra, à beirinha de completar seis meses de vida, avançou para a sua primeira organização. No geral o desafio correu muito bem, mostrando que não se perderam as rotinas treinadas no clube onde quase todos estivemos até à época passada. Ou seja, nesta idade em que se esperaria ver despontar o primeiro dentinho, parece que já podemos roer pão com côdea.

De manhã e ao princípio da tarde, disputaram-se a 5ª e a 6ª etapas do circuito regional Lisboa e Vale do Tejo de Desporto Escolar. Compareceram 186 alunos de 17 escolas ou agrupamentos escolares, com destaque para AE2 Abrantes, AE Entroncamento e ES Pinhal Novo, com 21 participantes cada. A concluir a jornada, realizou-se uma prova local, que reuniu pouco mais de três dezenas de concorrentes.

As duas etapas de desporto escolar marcaram a conclusão do respetivo circuito regional, em cujo ranking coletivo a Secundária de Pinhal Novo arrecadou quatro dos sete títulos atribuídos. Os outros três foram para Entroncamento, Abrantes e Palmela (Hermenegildo Capelo).

Fechados os circuitos regionais, deveria seguir-se agora a grande festa dos Nacionais, mas essa boa tradição foi interrompida há meia dúzia de anos, desaparecendo assim o que seria mais um estímulo para os praticantes do desporto escolar. Na mesma linha de desincentivo, foi igualmente abandonada a participação nos mundiais de desporto escolar (ISF), onde Portugal obteve várias classificações individuais e coletivas de relevo e foi anfitrião de duas edições do evento, em 2002 na Marinha Grande, e 2013 em Vila Real de Santo António/Castro Marim.

Voltemos à Praia do Meco, para deixar o registo dos vencedores. No conjunto das duas etapas e considerando que havia dez escalões, estiveram em jogo 20 títulos. Juliana Pedro (AE Lapiás, Sintra), Sofia Pulquério (ES Sampaio, Sesimbra) e Miguel Varela (AE José Saramago, Mafra) foram os únicos concorrentes a vencer as duas competições. Os outros 14 heróis do dia: Iara Pinho, Leonor Cardoso, Afonso Jesus, Dinis Martins, Martim Fortuna, Lucas Martins, Alexandra Tadeu, Margarida Figueiredo, António Oliveira, Gabriel Lopes, Gil Justino, Leandro Violante, Laise Marques e Inês Pimenta. Desses 14 vencedores, quatro representavam a ES Pinhal Novo; três, a EP Ciências Geográficas (Lisboa); dois, a Rodrigues Soromenho (Sesimbra); outros dois, a AE2 Abrantes; e os três restantes, a Hermenegildo Capelo, a AE1 Abrantes e a AE Entroncamento.

No ranking individual de Lisboa e Vale do Tejo (soma dos quatro melhores resultados) só há dois nomes que não estiveram em evidência no fim de semana: João Pedro (Juv M), totalista nas quatro primeiras etapas e nesse dia ausente em estágio de seleção, e Manuel Raposo (Inf B M), que segurou a posição mesmo sem vencer nas últimas duas etapas.

“Levantei-me com mais gosto para vir à escola”

A areia fina e dourada da praia é boa para a gente nela se estender depois de um revigorante mergulho, mas ter de palmilhá-la nas dunas e na mata, por longas meias horas (ou horas e meias) em busca de balizas que nem sempre estão onde julgávamos, isso já não é tão fofo assim.

Houve quem se queixasse da dureza dos percursos, de um ponto “mais escondido”, de meninos sozinhos “em pânico”, ou perdidos em grupo, cada um buscando na desorientação do outro o remédio para a sua própria desorientação. Já todos vivemos ou testemunhámos situações dessas. São atribulações do crescimento ou da falta de preparação. Às vezes ajudaria saber que uma cruz verde simboliza tronco, raiz ou árvore caída, e que uma mancha amarela corresponde a uma zona sem vegetação. Dizemos isto sem sombra de doutorice, mas alvejando dois casos concretos que nos foram relatados. Nesses momentos de atrapalhação reside também o fascínio da nossa modalidade. Quanto mais sabemos (ou julgamos saber), mais arriscamos, e, quanto mais arriscamos, mais perto ficamos de errar.

Estes reparos estão, porém, longe de retratar o tom geral das apreciações sobre as provas de 20 de maio. A esmagadora maioria dos participantes declarou-se muito satisfeita com o evento. E nós próprios, que estivemos no terreno durante todo o tempo em que se desenrolou a competição, não nos demos conta de qualquer situação alarmante. Vimos gente hesitante ou momentaneamente perdida, o que é habitual nesta fase de aprendizagem, mas vimos sobretudo muita alegria e aquela explosão de felicidade no momento de avistar o prisma branco e laranja. O numeroso álbum de fotos que reunimos num endereço disponibilizado aos responsáveis de todas as comitivas, comprova isso mesmo. O sangue novo que desta vez palpitou nas dunas do Meco vem enriquecer o historial deste mapa, que teve a sua primeira grande exposição há 25 anos, no POM de 1998.  No sábado de manhã, uma menina de Pontével, chegada à escola para apanhar o transporte para a prova, disse à sua professora aquilo que talvez muitos outros tenham experimentado: “Esta manhã levantei-me com mais gosto para vir à escola”.

Fernanda Moedas dá aulas na EB Dom Sancho I há mais de 20 anos. Tem um grupo de orientação com 14 meninos, mas só pôde trazer sete. Um deles obteve o 2º lugar na prova da manhã. Mas a maior satisfação desta professora foi ter proporcionado aos seus alunos uma experiência nova: eles nunca tinham feito dunas. Foi “duro, mas muito giro”. Em Pontével, treinam nos mapas da escola que ela própria cartografou e que incluem uma pequena faixa de mato na envolvente do recinto. De vez em quando, verificam-se ocorrências menos agradáveis, como o estranho desaparecimento de pontos fixos (cartões plastificados e agrafados nas árvores, por exemplo), mas a professora vai encontrando motivação para continuar a dedicar-se ao seu trabalho. E por isso, no início de julho, lá estará em Viana do Castelo, na Semana Nacional de Formação, para aumentar as suas competências no uso das novas tecnologias aplicadas a esta modalidade.

Cooperação com outras escolas e clubes

João Alves e Victor Delgado, dois veteranos com longa experiência de competição, trouxeram de Ourém oito alunos, representando dois agrupamentos de escolas. O terreno não tem sido ali propício a altos voos, por isso estreitam a cooperação. Até viajaram juntos para o Meco. E, mais do que os resultados (um 2º e um 4º lugares), valorizam os níveis de autoconfiança que a prática deste desporto ajuda a reforçar nos seus educandos.

Em Abrantes também se notam os benefícios da cooperação. Os dois agrupamentos da cidade fizeram-se representar por 35 alunos, acompanhados pelos professores Ana Gil e António Paulo. A 7 de junho vão faz um lanche partilhado e um percurso de orientação a pares (um de cada agrupamento de escolas). Aproveitarão para fazer a entrega de medalhas, que não foi possível realizar na Praia do Meco. E quem não vai faltar é José Oliveira, do COA, o clube que tem dado significativo apoio ao desenvolvimento do desporto escolar na região.

Poderíamos dizer outro tanto do CAOS, em relação a Sintra, ou do nosso ADN em Sesimbra, onde, graças ao empenhamento dos professores Jorge Baltazar e Noel Cabeça, vimos assistindo a um consistente reforço dos escalões de iniciação e formação, com treinos semanais de natureza física e técnica. E o mesmo se passará com Bruno Nazário no Entroncamento e com vários outros professores e treinadores noutras regiões do país. Entre os formadores com quem falámos agora a propósito do desporto escolar, o caso de maior sucesso é o da ES Pinhal Novo. Daniel Pó é ali professor há 27 anos e manteve sempre estreita ligação à Secundária de Palmela, onde Ricardo Chumbinho e José Paulo Pinho colocaram a orientação num patamar muito visível também. A perspetiva de os alunos mais adiantados na formação poderem federar-se num clube há de ter representado um poderoso estímulo para alguns. Daí a importância da cooperação, primeiro, com as Lebres do Sado e, depois, com o ADFA. Pinhal Novo transformou-se assim num autêntico viveiro de talentos: Tiago Romão, Jorge Fortunato, Fábio Pereira, Mário Silva, Luís Silva, Fábio Silva, Ricardo Reis, Ricardo Esteves.

Manuel Dias